Da isenção de mais-valias ao limite no aumento das rendas. O que vai mudar na habitação em Portugal?

António Costa apresentou esta quinta-feira um conjunto de medidas que têm como objetivo responder ao problema da habitação em Portugal. A limitação dos valores das rendas e a isenção de mais-valias foram algumas das medidas anunciadas.

A isenção de mais-valias, o fim dos vistos gold, a limitação dos valores das rendas foram algumas das medidas anunciadas esta sexta-feira pelo Governo, numa apresentação à imprensa que contou com a presença do ministro das Finanças, Fernando Medina, e da Ministra da Habitação, Marina Gonçalves.

António Costa apresentou assim um conjunto de medidas que têm como objetivo responder ao problema da habitação em Portugal, com várias dimensões abrangidas. “Queremos responder de forma completa em várias dimensões para responder ao problema da habitação para as diferentes famílias: aumentar a oferta de habitações para arrendamento, simplificar os processos de licenciamento; assegurar mais casas no mercado de arrendamento e vamos adotar medidas para combater a especulação imobiliária e por fim, medidas de apoio às famílias quer no crédito à habitação quer no regime de arrendamento”, referiu António Costa no final da apresentação.

Isenção de mais-valias

Os proprietários que vendam casas de habitação ao Estado ou autarquias vão beneficiar de isenção de imposto de mais-valias, anunciou o primeiro-ministro.

António Costa falava no final de um Conselho de Ministros em que foi aprovado um novo pacote legislativo sobre habitação com medidas que visam estimular o mercado de arrendamento, assim como a agilização e incentivos à construção.

A medida visa aumentar a oferta de casas para o mercado de arrendamento acessível.

Limitar o aumento das rendas

O valor das rendas dos novos contratos de arrendamento vai passar a ter critérios que limitam a sua subida, segundo anunciou hoje o primeiro-ministro. Medida visa combater a especulação dos preços do arrendamento.

“Para novos contratos a nova renda deve resultar da soma da última renda praticada com as atualizações que poderiam ter sido feitas no período do contrato”, explicou o primeiro-ministro.

Além destes dois critérios o valor da nova renda poderá ainda ter em conta o objetivo de inflação de 2% definido pelo Banco Central Europeu (BCE).

Proibição de novas licenças de alojamento local

As emissões de novas licenças de alojamento local “serão proibidas”, com exceção dos alojamentos rurais em concelhos do interior do país, onde poderão dinamizar a economia local.

O primeiro-ministro comunicou ainda que as atuais licenças de alojamento local “serão sujeitas a reavaliação em 2030” e, depois dessa data, periodicamente, de cinco em cinco anos.

Esta medida faz parte do regime de “forte incentivo para que regressem ao mercado de habitação frações habitacionais que estão neste momento dedicadas ao alojamento local”, justificou António Costa.

Contribuição especial terá que ser paga para manter imóveis no alojamento local

Os imóveis que se mantenham no alojamento local vão ser chamados a pagar uma contribuição especial.

“Iremos criar uma contribuição extraordinária sobre todos os imóveis que se mantenham no alojamento local”, disse o primeiro-ministro, salientando que a receita será consignada ao IRHU (Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana) para financiar políticas de habitação.

A medida visa também chamar a contribuir para as externalidades negativas que o alojamento local produz por parte de quem tem o benefício desta atividade.

Casas que saiam do alojamento local até 2024 não pagam IRS de rendas até 2030

Os proprietários que retirem as suas casas do alojamento local até ao final de 2024 e as coloquem no mercado de arrendamento habitacional vão ter isenção de IRS sobre as rendas até 2030.

“Vamos permitir a todos os que tenham fogos no alojamento local e os transfiram para arrendamento ter uma isenção de taxação zero em IRS até final de 2030,”, disse o primeiro-ministro.

Para beneficiarem de isenção de IRS sobre as rendas, precisou, os donos das casas no alojamento local terão de colocá-las no mercado de arrendamento entre fevereiro de 2023 e até ao final de 2024.

Quem transferir os imóveis para o arrendamento habitacional durante aquele período beneficiará de isenção de rendimentos prediais até 2030.

Estado compromete-se a pagar rendas com três meses de incumprimento

O Estado vai substituir-se ao inquilino e pagar rendas com três meses de incumprimento, para reforçar o mercado de arrendamento.

“Sabemos que a taxa de incumprimento no pagamento da renda é extremamente diminuta. Contudo, sabemos que há um receio na sociedade portuguesa e em particular em muitos proprietários” de que possa vir a haver incumprimento “e nunca mais se proceda ou seja lento a proceder-se à cobrança”, disse o primeiro-ministro.

Neste contexto, acrescentou, o Governo vai fazer uma alteração “para que todos os pedidos de despejo que deem entrada no balcão nacional e arrendamento, após três meses de incumprimento” possam ser pagos pelo Estado, ou seja, “o Estado passará imediatamente a substituir-se ao inquilino no pagamento ao senhorio das rendas”.

Em contrapartida, o Estado ficará na posição do senhorio para cobrar as rendas em dívida e, se houver “causa socialmente atendível” para justificar o incumprimento, assumirá o seu papel apoiando o pagamento das rendas ou avançando com uma medida de realojamento.

No caso de se tratar de um “incumpridor profissional”, então o Estado avançará com o despejo, explicou o primeiro-ministro.

Fim dos vistos gold

No âmbito de medidas para combater a especulação imobiliária, o Governo vai deixar de conceder vistos ‘gold’.

“Quantos aos vistos ‘gold’ já concedidos, (…) só haverá lugar à renovação se forem habitação própria e permanente do proprietário e do seu descendente, ou se for colocado o imóvel duradouramente no mercado de arrendamento”, anunciou o primeiro-ministro.

Simplificação de licenciamentos municipais

Os projetos de arquitetura vão passar a ser licenciados apenas com base no termo de responsabilidade dos projetistas e as entidades públicas serão penalizadas no caso de atrasos na emissão de pareceres.

Nesse sentido, o primeiro-ministro explicou que os projetos de arquitetura e os projetos de especialidades “deixam de estar sujeitos ao licenciamento municipal” e as câmaras emitem a licença com base “no termo de responsabilidade assinado pelos projetistas”.

“Esta medida de responsabilidade dos projetistas será acompanhada de um quadro sancionatório muito duro, a aplicar pela Ordem dos Engenheiros e pela Ordem dos Arquitetos a todos os projetistas que violem as ‘artis legis’ ou ‘legis artis’ ou que [violem] as próprias normas de construção”, afirmou o primeiro-ministro sobre este ponto.

Crédito à habitação: bancos obrigados a disponibilizar taxa fixa

Os bancos vão passar a ter de disponibilizar ofertas de taxa fixa no seu portfólio de crédito à habitação.

“Todos os bancos têm de oferecer no seu portfólio créditos a taxa fixa, nos créditos à habitação”, referiu o primeiro-ministro, sinalizando que com esta medida deixará de ser possível, como atualmente, que as instituições financeiras possam não disponibilizar esta oferta.

Famílias que vendam casas para pagar empréstimo da sua habitação isentas de mais-valias

O Conselho de Ministros aprovou a isenção de imposto sobre as mais-valias geradas na venda de casas quando o valor da venda se destine a amortizar o crédito da habitação própria e permanente do proprietário ou descendentes.

Em causa está, como precisou o ministro das Finanças a não tributação de mais-valias resultantes “da venda de imóveis do próprio” e que “sejam aplicadas na amortização do crédito de primeira habitação”, deste e de descendentes.

Subsídio de renda para famílias em esforço

O Governo vai disponibilizar um subsídio de renda, no valor máximo de 200 euros, para apoiar as famílias que estão a gastar com habitação mais de 35% do rendimento.

A medida pretende dar resposta às famílias de “grupos mais vulneráveis” e afetadas por quebras de rendimento.

“Estamos ainda a definir o melhor modelo”, disse a ministra da Habitação, Marina Gonçalves, na sessão de respostas aos jornalistas, no Palácio da Ajuda.

“O apoio não terá limite na elegibilidade”, adiantou, frisando que as famílias com “taxas de esforço acima dos 35%” do rendimento “estão já identificadas” e o importante é que a resposta seja “simples, ágil e eficaz”.

Questionada sobre os limites do subsídio, Marina Gonçalves indicou que serão equivalentes aos das tabelas vigentes para outros apoios ao arrendamento.

Regime de “arrendamento compulsivo” de casas devolutas

O Governo vai adotar um regime de “arrendamento compulsivo” das casas devolutas, no quadro do Programa Mais Habitação.

“Iremos introduzir, em complemento às medidas que já existem de agravamento fiscal dos imóveis devolutos, um regime de arrendamento compulsivo das casas que estejam devolutas”, anunciou o primeiro-ministro.

Caberá ao Estado ou ao município “pagar ao proprietário a renda que é devida” e cobrar “a renda que resulta do subarrendamento” que fará depois, precisou.

A ministra da Habitação, Marina Gonçalves, recordou que, segundo o Instituto Nacional de Estatística, existem cerca de 730 mil casas devolutas, mas escusou-se a fixar uma meta de redução a atingir com a obrigatoriedade de arrendamento.

Linha de crédito para municípios fazerem obras em casas devolutas

O Governo anunciou uma linha de crédito dirigida aos municípios, para que possam realizar obras em casas devolutas.

A medida prevê 150 milhões de euros para financiar a linha de crédito aos municípios para realizarem “obras coercivas em casas devolutas e com baixas condições de habitabilidade”, anunciou o primeiro-ministro.

Este financiamento aos municípios pelo Estado não é novo, mas as autarquias recorrem “raramente” ao atual modelo em vigor, salientou.

Taxa autónoma de IRS sobre as rendas vai baixar de 28% para 25%

Medida em sede de IRS diminui em três pontos percentual, de 28% para 25% a taxa autónoma que incide sobre os rendimentos de rendas.

A taxa autónoma que atualmente incide sobre os rendimentos de rendas está balizada há vários anos nos 28% – quando o senhorio não opta pelo englobamento dos rendimentos – havendo situações em que esta taxa pode ser reduzida em função da duração do contrato.

A medida aprovada reduz a taxa de IRS de 28% para 25% e mexe também nas taxas mais baixas de IRS que são atribuídas aos contratos de maior duração.

Assim, a taxa de IRS aplicada a contratos com duração entre 5 e 10 anos baixa de 23% para 15% e entre 10 e 20 anos recua de 14% para 10%.

Já nos contratos com duração superior a 20 anos a taxa do imposto recua de 10% para 5%.

Terrenos e imóveis de comércio e serviços vão poder servir para habitação sem alteração de licença

Terrenos ou imóveis autorizados para comércio e serviços vão poder ser utilizados para construção ou convertidos em habitação sem alteração de planos de ordenamento do território ou licenças de utilização, anunciou o Governo.

Neste âmbito, António Costa destacou a possibilidade de “terrenos classificados para utilização para fins de comércio ou serviços possam ser usados para a construção de habitação” e que “imóveis que estão licenciados para atividades comerciais ou serviços possam ser convertidos em habitações”.

A mudança, segundo o primeiro-ministro, poderá ser feita “sem necessidade de alterar qualquer plano de ordenamento do território ou licença de utilização”.

Programa vai custar 900 milhões de euros

As medidas do Programa Mais Habitação vão custar cerca de 900 milhões de euros, que serão mobilizados através das verbas do Orçamento do Estado, estimou o ministro das Finanças.

“O valor estimado do programa que hoje apresentamos é de cerca de 900 milhões de euros, não incluindo nesta estimativa o que venham a ser valores de custos com rendas, com obras a realizar ou com compras, e incluindo aqui o valor das linhas de crédito”, anunciou o ministro das Finanças.