No seguimento de vários episódios – cada vez mais, infelizmente – de “entradas de leão e saídas de sendeiro” na Justiça nacional, daquelas que levam os portugueses a duvidar da sua verdadeira natureza ou eficácia, com um novo governo e um consequente novo programa político para a Justiça, eis que – pela enésima vez – tudo parece centrar-se no combate à corrupção.

Não que não se deva ter em conta seja a perceção pública, sejam os dados objetivos tornados públicos sobre esta matéria. Contudo, resumir a política de justiça – ou mesmo a geral – a esta temática olvidando tudo o resto numa das áreas em pior estado num País que comemora os 50 Anos de Liberdade, é manifestamente redutor, fortalecendo a descrença e todos os espíritos populistas.

Na Justiça (em particular na Penal) não são precisas muitas mais leis ou grupos de trabalho, até porque – à boa maneira portuguesa – as últimas nem sequer foram cabalmente avaliadas.

Elas estão feitas, são muitas e boas, pecando – sim – por escassa ou ineficaz aplicação, falta de recursos (humanos, tecnológicos e logísticos) para as operacionalizar, bom senso dos que a aplicam, e, pela cultura de opacidade e corporativismo atávico das nossas magistraturas.

Confundir Justiça com Política é sempre perigoso, mas, apoiar-nos, cobardemente, no “mantra” popularizado por António Costa do “à política o que é da política e à justiça o que é da justiça” desresponsabiliza-nos, a todos, da tragédia em que se encontra este fulcral pilar do Estado.

Ao não separar cuidadosa e garantisticamente – como deve ser num Estado de Direito Democrático – “o trigo do joio” nas suas práticas justicialistas, imprensa, opinião publicada e agentes da Justiça prestam um mau serviço à Democracia, e, em contraponto, um bom serviço ao populismo e à demagogia que se têm generalizado.

Mais do que analisar quaisquer casos concretos, a necessária reforma deverá responsabilizar todos os agentes da Justiça (assim como o é o comum dos mortais) pelos seus atos e omissões, fornecer recursos dignos à sua pesada “máquina”, tornando-a célere e acessível ao cidadão.

O 25 de abril de 74 trouxe muitas – e necessárias – liberdades aos portugueses, garantiu condições dignas a muitos que nada tinham, reformou um Estado atávico e obsoleto, extinguiu privilégios injustificados, mas, cinquenta anos depois não conseguiu “libertar” do seu conservadorismo e corporativismo atávico um pilar do (de qualquer) Estado de Direito.

É hora de o cobrarmos enquanto sociedade livre e esclarecida, porque só assim cumpriremos abril.