Branko abriu o palco principal no terceiro dia do Vodafone Paredes de Coura com música nova na bagagem, um dia depois de ter lançado Vem, um single que quase entrou no Soma, álbum que lançou no início deste ano. Tratou-se de um regresso do veterano produtor e DJ às margens do rio Coura, depois de já ter passado no Sobe à Vila e no palco secundário do festival.

Numa altura em que se prepara para celebrar duas décadas de carreira, Branko pensa já na próxima década, que começou a preparar com o lançamento de Soma, e que passa por dar uma ângulo mais cultural à música eletrónica e de dança, tentando “puxá-la para as seis da tarde”.

Como foi abrir o palco no terceiro dia do Paredes de Coura?

Foi super bonito. Acho que tem alguma coisa especial esta cena de tocar cedo e ainda apanhar as pessoas com energia e com vontade de ver, de ouvir e de perceber os detalhes. Enquanto um DJ mais facilmente seria atirado para uma tenda às três da manhã, é sempre fixe, para mim, conseguir, com este formato novo, encaixar num slot, que, se calhar, há três ou quatro anos não fazia sentido nenhum. É um bocado uma dupla vitória por termos conseguido chegar a esse ponto, mas também o facto da quantidade de pessoas que já estava ali para ver o concerto… Acho que havia ali um sol um bocado incómodo, havia uma uma espécie de separação de águas, mas foi super bonito mesmo sentir que o pessoal saiu das tendas, saiu da sua vida e veio aqui ouvir e sentir a música.

Ainda para mais foi um regresso a Paredes de Coura…

Esta foi a terceira vez. Toquei uma vez no Sobe à Vila e depois toquei no segundo palco, bem mais à noite. Não foi assim super tarde, mas foi bem mais à noite. Aqui há aquela tradição de começar as coisas bem tarde…

Lançaste álbum novo este ano, lançaste música nova ontem. Como é que sentes que o público está a receber o Soma?

Para mim está a ser um bocadinho uma experiência nova, porque acho que o disco, de alguma forma, marcou um pouco uma fase nova do meu percurso artístico, pelo lado da instrumentação, pelo lado em que acabaram por acrescentar-se layers novas, de músicos, de riffs reais, de guitarras, teclas, etc.. Isso, junto com este novo formato ao vivo, é um pouquinho uma realidade nova para mim e está a ser super bonito perceber que as pessoas estão a assimilar as músicas e a ouvir o álbum como um álbum, do início ao fim. Não sinto que seja um disco que tem propriamente um ou outro single… Cada rádio está a tocar a música que escolheu do disco. Isso é super bonito e, para o tempo em que vivemos, em que os álbuns se calhar são meio ignorados e os singles acabam por ganhar um destaque maior, acho que acho que é uma vitóriazinha conseguir pôr as pessoas a consumir um álbum do princípio ao fim.

Falando em música nova, foi a primeira vez que tocaste a Vem ao vivo, até porque a lançaste ontem, e tocaste-a ali pertinho do público. Como é que sentiste receberam a música nova?

Confesso que, às vezes, sou um bocado aquela pessoa que inventa demais e tenta sempre ter coisas novas e inovar… Emociona-me tocar uma música nova, ter pensado em lançar uma música para poder chegar aqui e poder dizer que é a primeira vez! Isso emociona-me! O pessoal, se calhar, preferia mil vezes ouvir uma que sabem de cor, etc., mas eu tenho sempre essa cena de tratar o concerto sempre um bocadinho com aquele feeling da pista de dança, de tocar um som novo que ainda não saiu, que as pessoas vão ter acesso exclusivo ao ouvi-lo ali naquele momento… O Vem foi mais um exercício lunático… Acho que as pessoas curtiram, acho que a música está fixe. É uma parceria com um produtor que já conheço e de quem sou super cúmplice há muitos anos, que é o Mulú, antes chamava se Omulu… É uma pessoa que está desde os inícios dos inícios desta aventura meio Brasil, baile funk, música urbana, etc.., e com uma cantora que acho incrível e quero muito continuar a fazer coisas com ela, que é a Juniper… Oiço imensas vezes o EP dela, com produções exclusivamento do Sango… Acho que ela tem mesmo uma excelente voz e ela apanhou uma cena diferente. Poder vir aqui e ter um bocado a honra de estreá-la, num palco como este de Paredes de Coura, é uma coisa super bonita de acho que vou lembrar-me dela para sempre, mesmo que as pessoas se calhar tenham reparado mais na Tudo Certo, que entrou imediatamente a seguir… (risos)

O Soma nasceu de umas jam sessions durante a pandemia, com um processo de criação muito mais orgânico. Como é que surgiu esta Vem?

A Vem vem um pouquinho no seguimento de tudo isso. Talvez não tanto desse lado dos músicos e dessas jam sessions de que falaste, que aconteceram no início de 2023, um pouco já pós-pandemia. A primeira versão da Vem, a captação de voz foi feita pela primeira vez em novembro de 2022 e foi uma música que eu estava a jurar a pés juntos que ia entrar no Soma não entrou, ficou de for a… Foi preciso uma nova viagem ao Brasil e a parceria com Mulú para que o som acabasse por encontrar o seu caminho a nível de produção, a nível de direção musical… A ideia é um pouco criar um um apêndice do Soma, num trabalho que ainda estará para vir… Um Soma estendido ou expandido, por assim dizer…

Quando lançaste o Soma, disseste que estavas a marcar o início da tua próxima década. Que planos são esses?

Olha, acho que passa muito por esta desconstrução da música eletrónica, o que está a acontecer com a banda em palco, que as pessoas puderam ver hoje… Por outro lado, se calhar, mais produção, mais produção sem parar, para outros artistas, para mais gente. Mais foco a 100% na música e na criação. Acho que vivemos num mundo tão cheio de coisas que nos tentam roubar a atenção, as redes sociais… Hoje em dia, uma pessoa perde um dia a gravar uma música e depois quatro ou cinco dias a criar conteúdo para poder divulgar essa música. Fartei-me um bocadinho disso. Acho que a minha próxima década é um bocado essa afirmação do Branko enquanto artista, enquanto criador, um bocado mais anárquico nesse sentido… (risos) Sem essa questão de querer estar em cima, querer acompanhar, querer ter uma agenda específica, querer ter alguma coisa, mais tempo…

Queres só fazer e lançar cá para fora…

Exatamente! Estamos numa fase em que essa é a melhor forma. Aquilo em que acredito, a  música que sinto que tem a pureza que acho que precisa de ter para sair acho que sai e isso é um exercício super divertido.

Ainda só passaram alguns meses desde o Soma. Como está a correr este início da década?

(risos) Para mim está a correr super bem! Sei que não é uma palavra que se utilize, que é a ideia do palco principal, mas é o palco maior, mas a possibilidade de abrir um palco, de poder vir com o Soma, abrir aqui o palco grandão do Paredes de Coura para mim é um sonho e poder começar a concretizar essas coisas é exatamente para mim uma prova de que a década está a começar a correr bem e está a começar a correr na direção certa. Isso para mim é super especial. Conseguir, no fundo, continuar esta viagem de colocar um ângulo mais cultural na música de dança, na música eletrónica e conseguir puxá-la para as seis da tarde. Conseguir ter essa celebração de uma forma diferente é super especial para mim é exatamente isso que acho que a década será.

A minha próxima década será para celebrar a música eletrónica de uma forma diferente

Partilhaste há uns dias umas stories com o Anderson .Paak. Estás a preparar alguma coisa com ele? Podes partilhar?

Foi um projeto super bonito em que tive a honra de participar, um projeto chamado Jameson Distilled Sounds, que juntou uma série de artistas – não tanto up and coming, mas pessoas já com alguns seguidores e algum nome – para três dias de criação, aprendizagem, conferências… Foram três dias super bonitos de construção e de criação musical. Foi um encontro mais no âmbito dessa aventura e desse projeto… Não quer necessariamente dizer que venha aí uma música com o Anderson .Paak, se bem que gostaria, mas aconteceram coisas bonitas em estúdio, aconteceram momentos super interessantes.

Branko sobe pela primeira vez em nome próprio ao palco do Coliseu a 28 de novembro, para a celebração dos seus 20 anos de carreira.