2022 lembra-me uma frase com que iniciei um romance frustrado: um início prometedor para um final deprimente. O que se vai guardar deste ano parece-me ser bastante diferente daquilo que, pessoalmente, procurarei deixar gravado no arquivo da minha memória.
Realmente, este assunto não é apenas trocos. Ao desmentido deveria ter-se seguido, de imediato e sem mais, esclarecimentos, a revelação da real factura – só isso reporia a verdade – e até a discussão da justificação para o encontro, de governantes a fazerem fotos para promover restaurantes, etc. Isso, sim, seria uma praça de gente madura, para citar Zeca Afonso. Acontece que, neste beco de gentalha soba, a coisa resolve-se com execuções sumárias e protecções primárias, numa atitude prepotente que viaja desde as pressões “não se pode tratar mal a filha de um Presidente de um país amigo” até ao familygate, passando pelo afastamento de Marques Vidal. Aliás, foi exactamente essa uma das razões pelas quais muitos partilharam a falsa factura – porque, apesar da sua excentricidade, ela era possível. Porque esse topete, esse informalismo e o devorar da coisa pública são a pedra-de-toque destes governos Costa. Factura de 10 mil euros com um pretexto da treta? Muitos acharam obsceno, mas plausível. Desta vez era tanga, mas todos sabem que já aconteceu. E que, perante tanta sabujice e genuflexão, receios de levar estes debates até ao fim e subserviência em doses generosas, irá acontecer mais vezes. Talvez sempre.