Uma vez mais, as doenças raras estão na ordem do dia. Porque estamos no mês de fevereiro que, este ano, por ser bissexto, tem vinte e nove dias e permite a rara possibilidade de o assumirmos como diferente dos outros. Uma vantagem que, afinal, se traduz apenas na mediatização do período de tempo em que se fala mais das pessoas diferentes, que são raras e que, fora desta onda, são completamente esquecidas.

Bem sei que, esquecimento, pode não ser o termo adequado quando nos referimos a algumas destas pessoas. Mas, para uma grande maioria delas, o seu sentido talvez signifique muito mais, pelo que enfrentam ao longo de uma vida, devido à ignorância do seu diagnóstico, ou à falta dele, e às consequências de um desinteresse ainda profundo pela implementação de algumas soluções que, de tão simples e pouco onerosas, permitiriam aumentar o número de respostas que tantos reclamam há tantos anos, ou de serviços essenciais cuja necessidade tem sido amplamente exigida por parte de profissionais de saúde, das próprias pessoas com doença e seus familiares ou cuidadores e dos seus representantes.

A aposta na diversificação de opiniões e na introdução de novos conceitos, supostamente impostos pela obrigatória evolução do mundo para o digital, pela Inteligência Artificial e, em consequência, pela futura desumanização de muitos dos serviços de saúde onde as pessoas, por serem portadoras de uma doença rara, ali se dirigem à espera de respostas, vai conduzir os decisores a uma espera prolongada por consensos. Esses, já deveriam ter sido conseguidos e, até, aplicadas algumas das muitas medidas resultantes de uma discussão que se prolonga há tempo demais, na Europa e em todo o mundo.

A falta de planeamento para uma estratégia alinhada com os propósitos e com as normativas europeias e, até, mundiais, de médio prazo, assente em critérios e em medidas concretizáveis, que reúna um consenso médico, científico, social e político, sem esquecer todos os representantes dos doentes, tem feito crescer uma barreira que se está a tornar quase intransponível para quem pretende avançar para um nível superior de decisão. A incapacidade de reunir à volta da mesma mesa todos os “stakeholders “, aliada ao desconhecimento dos movimentos representativos e do muito trabalho já desenvolvido internacionalmente pelos membros portugueses que compõem os diversos organismos, transformou-se em adiamentos “sine die” para que os doentes raros tenham, em Portugal, as mesmas oportunidades de acesso e o mesmo reconhecimento dos seus direitos, como qualquer outra pessoa.

E, em matéria de acesso e de direitos, a lista continua a crescer. O direito aos tratamentos preventivos, onde se consideram todas as terapias clinicamente aconselháveis, aos produtos de apoio em tempo útil, à participação em ensaios clínicos em locais de maior proximidade, às consultas multidisciplinares de acompanhamento, a uma educação não exclusiva, à oportunidade de emprego sempre que isso seja possível, a uma maior autonomia e a uma vida menos dependente, são apenas algumas das injustiças que a inércia tem originado. Reconheço que estamos mais despertos para os problemas, mas isso, não os resolve.

Considero, por isso, muito importante que todos os que opinam sobre Redes de Referência Europeias, Centros de Referência Nacionais afiliados, investigação de excelência em terapias inovadoras, registos, dados digitais em saúde e tantos outros temas, abordados e discutidos quase em formato contínuo e até à exaustão, sejam capazes de transformar opiniões em decisões concretas.

Porque é muito urgente!

Porque os doentes raros esperam há tempo demais!

Joaquim Brites – Presidente da APN – Associação Portuguesa de Neuromusculares