Enquanto escrevo estas linhas, Israel e o Hamas estão a fazer mais vítimas numa guerra que há muito foi além do limite do que possa ser aceitável, mesmo para os que, ao contrário de mim, defendem a inevitabilidade de algumas guerras.

Deliberadamente, não coloquei no parágrafo anterior a alusão aos palestinianos, porque não confundo a Palestina e o seu povo com o Hamas, confusão que surge muitas vezes feita com o único intuito de justificar o que tem sido a postura consistente de Israel.

Não tenho qualquer hesitação em dizer que o que o Hamas fez foi um ato de terrorismo completamente desprovido de qualquer razão e que causa alguma pode legitimar.

Contudo, as últimas semanas têm sido particularmente demonstrativas de um desprezo pela vida de civis da parte de Israel que não se afasta do que, uma vez mais, também fez o Hamas. Em várias mesas de debates televisivos têm sido encontradas pessoas a tentar fazer tábua rasa de que, mesmo em situações de guerra, existem princípios básicos de direito que não podem ser ultrapassados, sob pena de que quem os viola não se afaste da conceção de bárbaros.

Ao contrário da maior parte das pessoas, não consigo concordar que um crime, ainda que horrendo, como foi o ataque do Hamas, sirva de justificação para outros, visando pessoas que nada tiveram que ver com aquele. A verdade é que, se é certo que Israel sempre gozou de grande apoio político e até junto da comunicação social, a tentativa de extermínio de que os judeus foram alvo não pode servir de justificação eterna para idênticas tentativas que decidam encetar, como se afigura ser o caso da que está em curso.

O que se está a passar em Gaza, mesmo que em resposta a um ataque do Hamas, não pode ser aceite por aqueles que ainda reputem que os fins não justificam todos os meios. Não podem ser atacados alvos civis. Não podem ser afetadas estruturas hospitalares. Não podem ser cortados os meios de auxílio médico. Ponto final.

Isto resulta de forma expressa das Convenções de Genebra e protocolos adicionais, ironicamente tendo algumas das suas previsões por base o contexto da Segunda Guerra Mundial. E isto tem de ser dito bem alto perante uma cortina de fumo que tenta transformar cada palestiniano num terrorista e, com tal, legitimar o seu aniquilamento, no mesmo transe em que se criticam – e com total propriedade – posturas idênticas de Putin.

O escritor que deu o mote a este título também escreveu que “a vida não é mais do que uma contínua sucessão de oportunidades para sobreviver”. O problema é que, em Gaza, o sentido a dar a esta frase é, infelizmente, literal. E, num mundo cada vez mais inundado pela cólera, talvez a solução esteja mesmo no amor. No amor pelos mais fracos, estejam onde estiverem. Incluindo em Gaza. Principalmente hoje, em Gaza, quando as vítimas são bebés, crianças, doentes, mulheres grávidas e idosos.

Advogada