O recente relatório das Nações Unidas sobre investidores, abordagens ESG e direitos humanos, apresentado ao Conselho de Direitos Humanos[1], sublinha um nexo crucial que exige a nossa atenção: a integração de considerações de direitos humanos nas estratégias de investimento ambientais, sociais e de governação (ESG).

À medida que o mundo se orienta para as finanças sustentáveis, é imperativo que os investidores não se limitem a adotar critérios ESG superficialmente, mas adoptem uma abordagem holística que respeite verdadeiramente os direitos humanos.

 

Os Princípios Orientadores e o investimento ESG

Os Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Empresas e Direitos Humanos (UNGP) estabelecem a responsabilidade dos investidores de respeitar os direitos humanos. Esta responsabilidade não é apenas um imperativo moral, mas uma necessidade estratégica para o investimento sustentável. Os investidores detêm uma influência sem paralelo sobre as empresas, capazes de promover progressos significativos na adesão aos direitos humanos através das suas escolhas de investimento e atividades de gestão.

Apesar da crescente popularidade dos investimentos ESG, continua a existir uma lacuna gritante na integração dos direitos humanos nestes enquadramentos. O relatório sublinha que muitos investidores não conseguem associar as normas de direitos humanos aos critérios ESG, muitas vezes devido à falta de compreensão de que os critérios sociais e muitos indicadores ambientais e de governação estão intrinsecamente ligados a questões de direitos humanos.

As abordagens de investimento ESG variam muito, carecendo frequentemente de definições uniformes e de normas globais. Esta incoerência pode conduzir ao “greenwashing” e ao “human rights-washing”, em que os investimentos são comercializados de forma enganosa como ambiental ou socialmente responsáveis, sem um apoio substancial. As práticas atuais ignoram frequentemente o impacto dos investimentos nos direitos humanos, centrando-se antes na materialidade financeira – como os fatores ESG afetam os retornos financeiros – e não na materialidade do impacto – como os investimentos têm impacto na sociedade e no ambiente.

Esta dicotomia é problemática. Para que os investimentos ESG estejam verdadeiramente alinhados com os UNGP, devem adotar uma abordagem de dupla materialidade, considerando tanto os retornos financeiros como os impactos mais amplos nas pessoas e no planeta. Só assim poderemos garantir que os investimentos ESG não apoiam inadvertidamente práticas que prejudicam os direitos humanos.

 

Passos para a integração

Os investidores devem efetuar uma diligência devida abrangente em matéria de direitos humanos como parte das suas estratégias ESG. Isto envolve a identificação, prevenção, mitigação e contabilização dos impactos adversos sobre os direitos humanos ao longo do ciclo de vida do investimento. A chave para este processo é o envolvimento significativo das partes interessadas, particularmente com grupos vulneráveis como os povos indígenas, as comunidades locais e os trabalhadores.

Além disso, os quadros regulamentares devem ser reforçados para impor a integração dos direitos humanos nos critérios ESG. Os Estados podem desempenhar um papel fundamental ao incorporarem estes requisitos nos planos de ação nacionais sobre empresas e direitos humanos, criando normas consistentes a seguir pelos investidores.

Várias jurisdições já iniciaram esta integração. Os regulamentos de finanças sustentáveis da União Europeia, incluindo a Diretiva relativa aos relatórios de sustentabilidade das empresas e o Regulamento relativo à divulgação de informações sobre finanças sustentáveis, exigem que os investidores divulguem informações relacionadas com os direitos humanos. Este movimento em direção à transparência é um passo fundamental para responsabilizar os investidores pelos seus impactos nos direitos humanos.

Na América Latina, países como o Brasil e o Chile implementaram regulamentos que exigem que os gestores de fundos de pensões e de seguros integrem critérios ESG, incluindo considerações sobre direitos humanos, nas suas políticas de investimento. Estes exemplos ilustram a viabilidade e os benefícios da integração dos direitos humanos nos quadros de investimento sustentável.

 

O caminho a seguir

O caminho para um financiamento sustentável é claro: os investidores devem integrar plenamente os direitos humanos nas suas estratégias ESG. Isto requer uma mudança de paradigma, deixando de ver os critérios ESG como silos separados para compreender a sua natureza interligada, com os direitos humanos no centro. Ao fazê-lo, os investidores podem não só melhorar o seu desempenho financeiro, mas também contribuir para um mundo mais justo e sustentável.

À medida que avançamos, o sector financeiro deve adotar esta abordagem abrangente, orientada pelos PONU. Só assim os investimentos ESG poderão cumprir a sua promessa de financiamento verdadeiramente sustentável, beneficiando tanto as pessoas como o planeta. Chegou o momento para que os investidores “se movimentem”, assegurando que as suas práticas se alinham com os mais elevados padrões de direitos humanos e sustentabilidade.

[1] Report of the Working Group on the issue of human rights and transnational corporations and other business enterprises