Os sistemas urbanos de água são um suporte essencial para a prestação de um serviço público de primeira necessidade, garantindo a saúde pública e o bem-estar da população, fomentando assim, um desenvolvimento socioeconómico sustentável. Deste modo, sendo a água um recurso estratégico e estruturante, é fundamental garantir uma elevada eficiência na sua gestão.

Mas estaremos a gerir, de forma eficiente, os sistemas urbanos de água?

É importante compreender que, uma quantidade considerável de água é perdida durante o processo de distribuição, nomeadamente, através de pequenas fugas em condutas e acessórios, resultado do seu avançado estado de deterioração, designadas por perdas físicas ou reais.

Dada a dificuldade em quantificar, rigorosamente, a quantidade de água perdida, as entidades que gerem estes serviços, baseiam-se no indicador de Água Não Faturada (ANF), que reflete a percentagem de água que, apesar de ser armazenada e distribuída, não chega a ser faturada aos consumidores. Este indicador permite avaliar a eficiência dos sistemas de distribuição e comparar a performance entre entidades gestoras. Note que, neste indicador, também está considerada a água consumida indevidamente e/ou incorretamente contabilizada.

Ora vejamos, no Algarve, segundo o último Relatório Anual dos Serviços de Águas e Resíduos em Portugal (RASARP), verificou-se uma média de 27% de ANF, existindo municípios onde este valor ascende os 40%. Adicionalmente, estima-se que, em 2021, cerca de 15,5 hm3 de água foram efetivamente perdidos, o correspondente a metade do volume útil da Albufeira da Bravura. Esta situação é observada recorrentemente nos últimos anos e parece perpetuar-se no tempo.

Acresce ainda observar, o modelo de gestão das entidades gestoras do Algarve e a sua relação com a qualidade de serviço, avaliada pelo indicador da ANF. Analisando os últimos dados, verifica-se que, as entidades gestoras com modelo de gestão direta municipal apresentaram uma média de 37%, correspondente a uma qualidade do serviço insatisfatória, contrariamente às entidades com modelo de gestão por delegação de competências, ou seja, empresas municipais, cuja média foi de 14%, qualidade de serviço satisfatória.

Tal facto, permite-nos concluir que, em entidades com modelo de gestão direta municipal, é imperativa a mudança de paradigma, sendo essencial a implementação de estratégias que promovam a eficiência e a inovação na gestão destes sistemas, contrariamente à vulgar gestão orientada por motivações eleitoralistas.

Significa isto que, recorrentemente, deparamo-nos com tarifários desajustados que, ao não cobrirem os custos de operação e manutenção e muito menos a urgente necessidade de realização de investimentos em reabilitação, não permitem manter as infraestruturas num estado de conservação adequado.

Esta gestão deficitária reflete-se, não só ao nível do elevado volume de perdas de água, traduzido pelos dados anteriormente apresentados, como também na qualidade do serviço prestado aos consumidores que, frequentemente, deparam-se com interrupções no fornecimento de água.

Importa ainda referir a atual situação de emergência relativa à escassez de água decretada para o Algarve, que prevê a adoção de medidas de contingência, com vista à redução de 15% do consumo no setor urbano. Estas medidas terão implicações severas nos consumidores, onde se prevê a adoção de restrições, com dotações máximas por tipo de consumidor, associadas a coimas em caso de incumprimento e aumentos significativos nos tarifários.

Mais uma vez, somos governados pelo lema: correr atrás do prejuízo. Para fazer face ao atual panorama, somos compelidos a agir de acordo com um conjunto de medidas e boas práticas que deveriam ter sido implementadas, gradualmente, durante as últimas duas décadas, e que agora deverão de ser implementadas ao longo dos próximos meses.

Tudo faremos para que o Algarve “sobreviva” a este momento avassalador que assola a região, com a convicção de que os mesmos erros não serão repetidos no futuro. Haja profissionalização e regulação efetiva deste setor!

Nota: Este artigo apenas expressa a opinião do seu autor, não representando a posição das entidades com as quais colabora. Os dados apresentados provêm da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR) – RASARP 2021