Nuno Cunha Rolo, que liderou a Transparência Internacional até ao ano passado, defendeu esta quarta-feira que a “gestão processual é tão importante como as próprias decisões” enquanto orador convidado da conferência do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD).

“Vivemos num paradigma diferente. É preciso não elitizar estas questões”, afirmou durante o painel ‘Escolha dos Árbitros vista por dentro e por fora’ do evento que teve o JE como media partner.

O especialista alertou, ainda, para o atual “foco na regulação” e para “dispersão legislativa”, nomeadamente no que aos diplomas e códigos em matéria de conflitos de interesse diz respeito, cujas definições são distintas.

Sobre a aplicação da lei, Nuno Cunha Rolo diz que hoje “já não basta ser um bom juiz para o fazer”. “É preciso, num mundo mais complexo e pluridisciplinar, haver outras valências e outras preocupações, nomeadamente de ética, confiança e perceção”, explicou.

“Culturalmente, temos alguns problemas. O maior problema é presumir que os advogados, juízes, académicos, só porque são doutorados  e têm 20 ou 30 anos de experiência, vão compreender e gerir melhor conflitos de interesse”, alertou.

Para o investigador autor em Direito Público e áreas TIBA (Transparência, Integridade, Boa gestão e Liderança e Anticorrupção), uma das prioridades deve estar em trabalhar a perceção pública.

“A questão da perceção é fundamental e é muito incompreendida, confundindo-se a perceção de corrupção com a própria corrupção”, afirmou, alertando que “é possível ser-se independente e ser-se parcial”. Nuno Cunha Rolo realça que “as decisões dos tribunais normalmente até são bastante boas, muito bem estribadas e fundamentadas. Mas os cidadãos não as vão ler”.

O especialista chamou a atenção, ainda, para o “cuidado com a elitização da seleção de certos árbitros”. “Isso é um outro perigo. Não basta a competência técnica hoje em dia. É competência e confiança que, juntas, são igual a integridade. Não basta a competência, tal como não basta a independência”, analisou.

Questionado sobre se as arbitragens das Parcerias Público-Privadas (PPP) deveriam ser acompanhadas pela Unidade Técnica de Acompanhamento de Projetos (UTAP), Nuno Cunha Rolo foi taxativo: “Sim, sem dúvida. A proposta faz todo o sentido”.

“Estamos sensibilizados para estas matérias, mas falta implementar. Há respostas desde culturais a interesses privados. O problema não é ter interesses privados, mas que prevaleçam sobre os públicos. Temos de saber fazer o que está certo. Como o princípio da integridade, que é muito mais do que a independência e da imparcialidade, até porque não se confina só ao decisor. Pode haver juízes muitos bons e o sistema de justiça ser mau. No limite, isto é possível. O paradigma mudou”, afirmou.

 O evento do CAAD – Centro de Arbitragem Administrativa teve lugar esta quarta-feira, dia 6 de novembro, no Estúdio Time Out Market, em Lisboa.