Nos últimos meses assistimos às novelas orçamentais, de um lado Pedro Nuno Santos que entrou na arena negocial, cheio de confiança e exigências, querendo deitar por terra as bandeiras de campanha do PSD: o IRS Jovem e o IRC e, do outro lado, Luís Montenegro, com uma proposta “irrecusável”. Percebeu-se depos a escolha da palavra, a proposta era irrecusável para o PS, porque a dita proposta era socialista.
O primeiro-ministro traiu, nessa altura, o que defendeu na campanha – o que o fez, aliás, ganhar as eleições – e adotou o IRS Jovem socialista, além de ter tornado pífia a descida do IRC. No dia 17 de outubro, o secretário-geral do PS veio terminar a novela, dizendo que vai dar indicações para que os socialistas se abstenham na votação do Orçamento do Estado para 2025. Agastado pelas críticas internas, mostrou que teria, se calhar, algum carisma se tivesse feito estas declarações umas semanas antes.
Estas negociações mostraram, no fundo, que vai tudo manter-se igual ao que já era, porque o PS saiu do poder, mas o poder não saiu do PS. A inutilidade do voto útil a revelar-se de novo, pela mão de Montenegro curvado ao Largo do Rato.
Que o PSD não seja reformista já se sabia. Que fosse capaz de apresentar um orçamento socialista, contrário ao que supostamente defende, tenho alguma dificuldade em entender… Mas o que é incompreensível é ver que todos consideram que baixar consideravelmente o IRC não é essencial – à exceção da Iniciativa Liberal. Ainda para mais num momento em que os dados sobre o aumento de risco de pobreza em Portugal são alarmantes.
Num país em que quase dois milhões de portugueses vivem com menos de 591 euros por mês, tornar a nossa economia mais competitiva é fundamental. Baixar substancialmente o IRC seria, por isso, essencial para Portugal, que perde competitividade face a tantos outros países europeus. Só assim teríamos mais e melhores empresas com mais e melhores salários.
Aqueles que diabolizam as empresas e os outros que cedem a estes populismos, só para se manterem no poder, estão no fundo a condenar os portugueses a sobreviver a vidas indignas e a passar pelo calvário de chegar ao fim do mês com dificuldade.
No nosso país, parece que viver de forma desafogada é pecado e atualmente, ainda que por outras palavras, a máxima salazarista do “pobre, mas honrado” está enraizada em todos nós, como se ser rico fosse uma desonra.
Por isso, das duas uma: ou pensamos que de facto a riqueza é coisa do diabo e se calhar somos todos uns viciados em jogo, já que em 2023 apostámos 3136 milhões de euros em jogos sociais geridos pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) ou então queremos viver melhor e achamos que só através do jogo é que vamos conseguir concretizar os nossos sonhos.
Que país queremos?
Um país que suspira com o próximo jackpot e que, nas filas para meter o Euromilhões, sonha acordado com o que faria, caso ganhasse o prémio, que depois não vai receber? Ou um país que tem bons salários e com o que ganha vive sem precisar de escolher entre a comida e os medicamentos?
Isto não tem nada de ideológico ou estratégico. É uma visão muito pragmática sobre o tipo de país que queremos e para isso só precisamos de parar de acreditar nos cantos da sereia de quem tudo promete a todos ou de quem põe uns contra os outros, porque é na desordem que justificam a sua existência.
Havendo escolha, não tenho dúvidas que Portugal vai crescer se se tornar num país onde as empresas podem ambicionar mais e com elas os trabalhadores possam prosperar.
Vice-presidente da Iniciativa Liberal, deputada municipal em Lisboa