Nas últimas semanas, consolidou-se um cenário de empate absoluto entre os candidatos, com a ligeira vantagem que Kamala Harris ainda detém nas sondagens nacionais a dissipar-se nos swing states. Dos sete estados decisivos, a maioria encontra-se agora num empate técnico. As previsões dividem-se: Trump parece estar à frente no Arizona, Geórgia e Carolina do Norte, enquanto Harris lidera no Nevada, Michigan e Wisconsin. A Pensilvânia, contudo, é unanimemente considerada o estado crucial, sendo praticamente impossível vencer as eleições sem conquistar os 19 votos eleitorais do Keystone State.

Neste momento, todos os esforços estão centrados na Pensilvânia, com ambos os candidatos a canalizar mais recursos, comícios e fundos para este estado. Scott Tranter, da Decision Desk HQ, defendeu que quem vencer a Pensilvânia terá aproximadamente 85% de probabilidades de ser o próximo presidente. Nate Silver, por sua vez, é ainda mais categórico, sugerindo que o vencedor da Pensilvânia terá 90% de hipóteses de conquistar a presidência. Importa referir que, nas últimas décadas, apenas em duas ocasiões o mesmo candidato não conseguiu vencer os três estados da chamada Blue Wall, composta pela Pensilvânia, Michigan e Wisconsin.

Sendo o quinto estado mais populoso do país, a Pensilvânia reflete, de certo modo, a diversidade dos Estados Unidos. Predominantemente branco, o estado conta com uma população afro-americana de 12% e algumas cidades industriais, como Allentown, já abrigam uma maioria de comunidade latina. No leste, a população concentra-se ao redor de Filadélfia, cuja demografia eleitoral se assemelha à da Costa Leste, amplamente dominada pelo Partido Democrata. O restante território, com exceção de Pittsburgh e seus subúrbios, é maioritariamente rural e conservador, onde os republicanos têm uma vantagem confortável.

Este estado também ilustra uma tendência que se verifica a nível nacional: enquanto Trump foca a sua estratégia em mobilizar a base conservadora, Harris procura atrair eleitores mais moderados, descontentes com o atual Partido Republicano. Trump tem concentrado esforços nas áreas suburbanas e rurais, enquanto Harris tem percorrido o estado, dando especial atenção aos grandes centros populacionais – como Filadélfia e Pittsburgh, mas também Harrisburg, Allentown e outras cidades menores –, numa tentativa de ampliar a sua vantagem entre os eleitores urbanos e melhorar a sua performance nas zonas rurais.

Kamala Harris não deve estar tranquila. A média das sondagens do site FiveThirtyEight concede-lhe uma ligeira vantagem de 0,6 pontos percentuais, mas convém recordar que Joe Biden, que venceu em 2020 por 1,2%, estava 4,7 pontos à frente nos dias que antecederam as eleições. Este é, sem dúvida, um dado relevante: se as sondagens tiverem um bias semelhante ao dos últimos dois ciclos eleitorais, Trump poderá estar, de facto, à frente. Este cenário poderá justificar a ansiedade que se sente nos círculos democratas, sobretudo porque a campanha de Harris parece ter perdido o ímpeto demonstrado nas semanas após a retirada de Biden. A dupla Harris/Walz enfrenta, assim, dificuldades em conquistar os eleitores indecisos.

Por outro lado, há indícios preocupantes de que alguns segmentos da base tradicionalmente democrata, como os homens afro-americanos – esta semana, Barack Obama fez um apelo vigoroso a este grupo –, latinos e jovens, particularmente em swing states chave, podem estar a distanciar-se. O Michigan, por exemplo, apresenta sinais de que a minoria muçulmana e os jovens liberais poderão boicotar a sua candidatura devido à situação no Médio Oriente.

Se confiarmos nas sondagens – e muitos são cépticos –, estamos perante uma das eleições mais disputadas da história. Caso as projeções se mantenham inalteradas nas próximas semanas, podemos antecipar recontagens, processos judiciais e vários dias de incerteza até sabermos quem será o próximo presidente norte-americano.

Não podemos desconsiderar, obviamente, que o desfecho final acabe por não ser assim tão renhido, como recentemente sugeriu o lendário estratega democrata James Carville. Continua a ser plausível que, nestas últimas semanas de campanha, o eleitorado “caia” para um dos candidatos, o que poderá resultar numa vitória clara em vários destes sete estados. Mas neste momento isso não parece muito provável.

Especialista em política norte-americana