“Nada de bom resulta da violência” (M. Lutero).

 

Como este é um assunto que mexe, pelo menos comigo e bastante, volto a ele, mas noutra perspectiva. Tentando indagar um pouco mais sobre ele, vendo as razões intrínsecas que possam levar aos atos violentos de agressões (físicas, verbais e morais), altercações e impugnações. Se bem que nada justifica, ou deve justificar, a vontade expressa e concretização desses atos malignos para qualquer ser, para as comunidades locais ou para as sociedades globais. Mesmo sendo cientificamente certo que a agressividade, em si mesma, é inerentemente neurobiológica, regulada por reações neuroquímicas. A violência tem sido algo iminente, mas desprovida da qualidade de “eminente”. Porque a violência (= agressividade num estado alterado) nunca pode ser uma virtude ou um qualificativo, nem muito menos elevada à categoria de excelente!

Não esqueçamos que o ser humano não deixa de ser um animal, embora dotado de racionalidade e de um cérebro com inteligência (embora nem todos queiram ou consigam exercê-la), por natureza própria. É preciso saber usá-los, estimulá-los e preservá-los! Não sejam aquilo que nalguns parecem e para os quais não foram criados: servir apenas de adorno disfuncional, de tom pernicioso e preguiçoso. E, portanto, como todo e qualquer animal, nasce com um instinto natural que comparte com as outras espécies animais, não racionais: a agressividade, que vem do passado tanto em hereditariedade como em precariedade. Como sabemos, este instinto permite-nos a adaptação ao ambiente e a defender-nos do perigo surgente. Repito: defendermo-nos! Não provocar o perigo em si nem por si. Nesse estar em alerta típico do ser (que não só da doutrina escutista) não se tem, necessariamente, que ser agressivo na defesa a ter. Sempre, ou quase sempre, se perde a razão quando se envereda pelo caminho agressor. Um caminho, sem dúvida, desviante, paralisante e periclitante.

Importa lembrar que nenhum ser nasce sozinho, mas do seio de um grupo societal – a família – no qual vive, normalmente, boa parte da sua vida, integrado num sistema social que, mesmo inofensivamente e/ou sub-repticiamente, acaba por estar estruturado de ingredientes para alimentar a forma agressiva de se ser, estar e atuar. Por vezes, por muito que um ser tenha boa conduta e bom coração, poderá acabar por cair na malha societal da agressividade, por se sentir ameaçado, como no “simples” ato do falar e no modo como se fala. O mundo em que vivemos, e não é de agora – é tão primitivo que já vem da Pré-História –, tem-na no seu organismo e, por conseguinte, na sua desorganização.

Se houvesse muito mais passividade de agressividade nos meios universais da comunicação, haveria bem mais pacificidade! Extinga-se a violência nos noticiários, nas séries, nas imagens, nos discursos e comentários, na internet e redes sociais, bem como nalgumas artes: em determinados filmes, livros e pinturas, etc., para que essa escalada generalizada não aumente. Importa mantermos a agressividade natural em nós adormecida, profundamente, tentando até fossilizá-la, através da boa prática da razão (equilibrada com o coração) e da inteligência que nos assiste – ambas já supracitadas – e através de atividades que engrandecem a nossa dimensão espiritual (e.g., as boas ações que vêm da nossa alma). Há que treiná-las para que vençam, sempre e cada vez mais, todo e qualquer tipo de agressividade e violência! Que estas jamais sejam ativadas por certos inibidores sociais. Como temos mentes muito imaginativas e vidas sociais supercomplexas – e nem sempre com boas interações –, isso despoleta-nos conflitos interpessoais, ressentimentos e confusões. Interajamos melhor e mais doados, uns com os outros e quotidianamente, para evitar esses dispensáveis resultados.

Não nos esqueçamos, também, que há muitos seres humanos que, tantas e tantas vezes, ambicionam controlar e ter poder: fazê-lo sentir e cumprir (mesmo que não o saibam exercer, levando-os a serem coercivos). Desmoronando-se esse poder – a ponto de se descontrolar e se absolutizar – é quase automática que a nossa bactéria da agressividade venha logo ao de cima, descarregando assim a bateria da afetuosidade feita pacificidade (que deseja morar sempre, e a 100%, em todos nós). Realce-se que uma pessoa pode ser combativa, na boa acepção do termo / no sentido positivo, sem ter de recorrer à crispação ou à hostilidade (seja mais ou seja menos agressiva). Ou seja, a pessoa pode vincar-se pelas suas ideias e ideias, mas não vingar-se! E deve recatar-se e não expor-se aos meios onde, habitualmente, a agressividade habita.

Feita uma descrição mais dedutiva, passemos à realidade mais indutiva (e inegável), baseada na nossa génese – através da ciência: está provado que a agressividade aumenta nos humanos devido à diminuição da atividade dos neurónios com serotonina. Esta é uma “hormona segregada no tubo digestivo e no tecido cerebral”, que, entre outras funções, também “age sobre o sistema nervoso central” (em dicionário Priberam). Concretamente, é um neurotransmissor que pode modificar várias das nossas áreas cerebrais, sendo a mensageira que conduz e equilibra os sinais transmitidos entre as células nervosas e as outras células corporais. É responsável, principalmente, pelos sentimentos relacionados com o bem-estar, o contentamento e o prazer.

Ora, quando a quantidade de serotonina diminui no nosso corpo, ocorre uma atitude negativa: ficamos mais agitados e nervosos, criando-se assim ansiedade, tristeza, apatia e violência impulsiva. Essa sua deficiência ou insuficiência pode causar-se por baixos níveis de triptofano, devido à ausência de aminoácidos, ácidos gordos, vitamina D e ômega-3 no corpo. Derivado a esse estado negativo, e que sintomaticamente interfere com a reação humana, a pessoa violenta tende a ter antecedentes, bem como baixa-estima e sentimentos depressivos e suicidas. Tudo isso leva-a a consumos excessivos de álcool, tabaco e drogas e/ou a problemas de saúde mental (esquizofrenia – como sucedeu neste recente caso do triplo homicídio na barbearia “Granda Pente”, em Lisboa –, transtorno bipolar ou transtorno de personalidade), cometendo crimes com maior facilidade, já que fora de si mesma – não sóbria, mas tão sombria…

Portanto, e depois de todas estas análises – e por muito masoquismo e ceticismo que possa haver numa pessoa –, custa-me acreditar que alguém se sinta bem e seja feliz a ser recorrentemente violento, a fazer mal intencional aos outros com satisfação, a não ficar sem sono e problemas de consciência quando mata outrem ou quando faz explodir algo para dizimar e vitimar gente inocente. É muito difícil entrar e perceber o que vai no âmago de alguém portador dessa inflamada agressividade interior – transmutada em violência –, e que nem sempre se reflete no exterior! E sem percebê-lo bem, não é qualquer um/a que consegue ajudar devidamente esse alguém…