Javier Milei detalhou a sua visão sobre os dez pontos do Pacto de Maio, que assinou com 18 governadores, visando um consenso da classe política em torno da base para transformar a matriz económica do país. O pacto firmado com representantes “de todos os setores da política e da sociedade” é “o pontapé inicial de uma nova ordem para o país”, disse o presidente argentino na cerimónia de assinatura.
Eis alguns pontos essenciais sobre o documento, uma espécie de “dez mandamentos” do presidente ultraliberal argentino para inverter a profunda crise económica e financeira do país sul-americano, assinado em Tucumán, cidade 1.300 km a Noroeste de Buenos Aires, onde foi declarada a Independência do país, a 9 de julho de 1816.
O que contempla o Pacto de Maio
O Pacto de Maio inclui desde compromissos com o equilíbrio orçamental e com a redução de gastos públicos até um conjunto de reformas como a tributária, a laboral e da segurança social, passando pela abertura comercial do país e pelo corte na burocracia que trava o crescimento económico.
O documento visa construir um consenso político capaz de colocar o país no caminho de reformas económicas que tornem os dez pontos uma realidade, apesar da ultra minoria parlamentar de Javier Milei e de um número significativo de opositores.
Milei terminou o discurso prometendo levar todos os dez pontos ao Congresso argentino: “Viemos aqui para construir uma nação. Por esta razão, decidimos criar o Conselho de Maio, que terá como objetivo traduzir cada uma dessas subsecções em legislação efetiva que enviaremos ao Congresso”.
A inviolabilidade da propriedade privada
Para Milei, a propriedade privada é “a primeira e mais básica instituição da sociedade”.
“Quando o político confisca o fruto do trabalho do indivíduo através de impostos, está a confiscar o seu tempo, o seu sacrifício e a sua liberdade. Além disso, a defesa da propriedade não se trata apenas de um direito, mas da fórmula para o crescimento económico”, disse Milei na sua intervenção.
“Quanto mais livre é um povo, mais rico ele se torna. Respeitar a inviolabilidade da propriedade privada é ratificar aos argentinos que eles são os donos das suas próprias vidas e dos seus próprios destinos”, acrescentou.
Equilíbrio orçamental inegociável
Para Milei, o défice orçamental crónico “é o ovo da serpente da decadência argentina, porque é a origem de todos os problemas” da economia nos últimos 100 anos. A dívida, a pressão fiscal asfixiante, a emissão monetária e a inflação nada mais são do que sintomas, consequências do gasto público sem respaldo nem financiamento.
“Não se pode gastar mais do que se ganha e não se pode impor a quem pagará impostos no futuro a resolução do desperdício do presente”, sublinhou.
A redução do gasto público para níveis históricos em torno de 25% do PIB
Com a assinatura do Pacto de Maio, disse o presidente argentino, inicia-se o compromisso de reduzir o gasto público para níveis históricos de cerca de 25% do PIB.
“O nosso país tem recursos naturais e um capital humano hipertalentoso e trabalhador, mas não prospera porque o setor privado, as empresas, os trabalhadores e os empresários carregam nas costas mais de 40 pontos do PIB em despesas do Estado”, disse Milei.
“Estes gastos exagerados só podem ser financiados com impostos que sufocam a nossa economia, com uma inflação que pulveriza os salários e que impossibilita o cálculo económico, ou com dívidas, que são impostas às gerações futuras”, considerou.
Educação útil e moderna, com alfabetização plena e sem abandono escolar
Para o presidente argentino, o país atravessa uma crise educacional inegável: “Identificamos hoje que o cerne da crise está no fracasso que tivemos como país em educar adequadamente os nossos alunos”, adiantou, referindo que sete em cada dez crianças argentinas não entendem os textos que leem.
“Há décadas que nos concentramos exclusivamente no Ensino Superior e, enquanto olhávamos para o outro lado, o analfabetismo escapou pelas frestas dos primeiros níveis de ensino. Fingimos não ter noção durante décadas e aqui estamos hoje numa situação incompatível com a tradição educacional do nosso país, que foi o primeiro a acabar com o analfabetismo no mundo”, frisou.
Uma reforma tributária simplificadora
Milei defendeu em Tucuman uma reforma tributária que reduza a pressão tributária, que “simplifique a vida dos argentinos e que promova o comércio”.
“O nosso sistema tributário é asfixiante, labiríntico e instável. A Argentina tem de deixar de ser um inferno fiscal para aqueles que trabalham, que se esforçam e que investem. O nosso país tem uma carga tributária explícita que ultrapassa 30% do PIB”, disse o presidente argentino.
Nos últimos 15 anos, tem crescido de forma constante e, não foi mera coincidência que, neste mesmo período, a Argentina foi o país que menos cresceu na América Latina, adiantou.
A discussão sobre impostos federais
O Pacto de Maio, referiu Milei, representa também o compromisso de reabrir a discussão sobre a divisão de impostos federais para “acabar para sempre com o modelo extorsivo que as províncias sofrem”.
“O nosso federalismo é fraudulento, pune aqueles que são fiscalmente responsáveis e produtivos; e só serve para que, de Buenos Aires, os políticos rapinem as províncias em troca de favores políticos”, adiantou.
Avançar com a exploração dos recursos naturais
Para Milei, Deus deu aos argentinos a “possibilidade de que, em todos os cantos do país, possam criar riquezas e desenvolver as suas vidas de maneira digna”. “Mas os políticos têm ouvido mais as exigências das minorias barulhentas e das organizações ambientais financiadas por milionários estrangeiros do que as necessidades dos argentinos de prosperar”, acrescentou.
“Viemos para mudar isso, para deixar para trás a demagogia benfeitora que condena milhões de argentinos à miséria para ter a aprovação de uns poucos ricos. A natureza deve servir aos seres humanos e ao seu bem-estar; não o contrário. Os problemas ambientais têm de colocar o indivíduo no centro. É por isso que o principal problema ambiental que temos é a pobreza extrema”, afirmou.
Uma reforma laboral moderna que promova o trabalho formal
O regime trabalhista que prevalece na Argentina há 50 anos “é obsoleto e prejudicial”, criticou Milei, e, por isso, duas em cada dez pessoas em idade produtiva têm emprego formal e há dez anos que esse número é praticamente constante.
“Paralelamente, a única coisa que cresceu na Argentina nos últimos 10 anos foi o emprego público. Deve entender-se que a atual legislação foi desenhada para um país que eliminou a pobreza e não tinha desemprego. Este país não existe mais. Somos um país pobre, com a maioria da população a trabalhar em condições precárias. Precisamos gerar trabalho. Trabalho formal de qualidade. E para isso é fundamental gerar riqueza”, adiantou.
Uma reforma da Segurança Social que dê sustentabilidade ao sistema
Para Milei, não é possível avançar com a reforma laboral sem uma reforma profunda do sistema de pensões, que dê sustentabilidade ao sistema e que respeite quem contribuiu: “O sistema da segurança social argentino está falido e tem um desenho de incentivos que o torna insustentável e imoral”.
A abertura ao comércio internacional
O Pacto de Maio representa também o compromisso de abertura ao comércio internacional “para que a Argentina seja protagonista do mercado global”, defendeu Milei.
“A nossa economia é a terceira mais fechada do planeta, apenas superada pela do Sudão e pela da Etiópia. A política quis convencer-nos, demagogicamente, que fechar a economia era proteger os argentinos. Uma economia fechada serve apenas para proteger alguns amigos do poder para que possam vender produtos mais caros e de pior qualidade aos 47 milhões de argentinos. Uma economia fechada impossibilita que milhares de empresas, empreendedores e profissionais argentinos vendam os seus bens e serviços no exterior. Não há possibilidade de crescimento se não nos abrirmos ao comércio”, afirmou.