Augusto Santos Silva, o ex-presidente da Assembleia da República, esse grande emigrante português, profundo connaisseur da nossa diáspora, será cabeça-de-lista do PS no círculo Fora da Europa. Outra vez. Mais uma vez.

Já José Cesário, deputado há 40 anos, será cabeça-de-lista para o círculo Fora da Europa pela Aliança Democrática. Isto é que é renovar e democratizar!

À segunda, quarta e sexta, os partidos rojam-se por aí a carpir a fuga dos jovens do nosso país (já vai num terço), a hemorragia de cérebros e a perda do investimento em ensino superior. À terça, quinta e sábado apresentam medidas pífias para inverter esta situação (como os irridentes bilhetes de Interrail de António Costa), em nada estimulam o aumento da natalidade dos portugueses e ainda desprezam os votos dos nossos emigrantes. Sim. Porque Santos Silva ou Cesário representam o mais absoluto desdém por estas crescentes e muito importantes comunidades.

Para o círculo da Europa, a coisa não é melhor.

O PS volta a apresentar Paulo Pisco como cabeça-de-lista, enquanto a AD volta a chamar Carlos Alberto Gonçalves, posto que Maló de Abreu já não está disponível… nem sequer para o Chega. Pelos outros partidos, as escolhas também não são brilhantes, bem antes pelo contrário, mas claro que só socialistas e sociais-democratas elegerão.

Mas nada disto é novo ou deve espantar. Basta relembrar episódios recentes na vida política portuguesa para confirmar que esta troça é um padrão. Por exemplo, o que se tem passado com o voto emigrante demonstra como são tratados como portugueses de segunda: envelopes de voto que não chegam a tempo, compatriotas que palmilham quilómetros para votar e dão com o nariz na porta, confusões com o cartão de cidadão. Resultado: um terço não conseguiu votar porque nunca recebeu o boletim, outro terço não conseguiu porque o boletim veio devolvido e, do terço que conseguiu exercer o seu direito, 22,3% dos votos foram considerados nulos.

Depois de tudo isto, apresentar o governo sem contar os votos dos emigrantes passou ao nível de zombaria pela diáspora. Aliás, se este rosário de trapalhadas tivesse acontecido com os votos dos residentes em Portugal, as eleições tinham sido impugnadas.

De resto, afinal, para que tem servido a nossa lutadora comunidade emigrante senão para selfies quando se fazem visitas de Estado ao estrangeiro?! Já para facilitar a sua participação na vida nacional, mesmo que através de um simples voto, nem pensar. Até na pura propaganda a coisa é preguiçosa, como demonstrou Marcelo numa recente visita aos luso-canadianos de Toronto: “Somos fado, somos bacalhau, somos Cristiano Ronaldo.” Queriam coisa mais indolente? Se isto não é escárnio, o que será?

Muitos destes jovens e menos jovens não acharam futuro quando residiam em Portugal e por isso o deixaram. O que o país lhes inflige quando já vivem fora só confirma a inteligência da sua decisão. Regressar? Só se for por amor à pátria. O mesmo que estes políticos não têm. Nem gota.

CASO SÉRIO
Como é possível que António Damásio tenha sido membro do Conselho de Estado durante sete anos sem apresentar a obrigatória declaração de património? O que andou o Tribunal Constitucional a fazer durante todo esse tempo? Leva assim tanto a fazer uma simples notificação? Bom, se estas são as nossas instituições, nem dá para imaginar como serão as nossas informalidades.

Ativista política
Artigo publicado na edição do NOVO de sábado, dia 17 de fevereiro