A Assembleia-Geral das Nações Unidas voltou hoje a debater a guerra em Gaza, depois de os Estados Unidos terem vetado no Conselho de Segurança, em dezembro, uma alteração russa a uma resolução para impulsionar o envio de ajuda humanitária. Sem a emenda, a resolução foi aprovada, embora com a abstenção tanto de Washington como de Moscovo.
A alteração russa teria incluído um apelo para um cessar-fogo na Faixa de Gaza, onde, desde 7 de outubro, mais de 23 mil pessoas foram mortas e 1,9 milhões estão deslocadas devido aos bombardeamentos e a uma ofensiva terrestre israelitas para eliminar o Hamas, desde 2007 no poder no enclave palestiniano e classificado como organização terrorista pelos Estados Unidos, a União Europeia e Israel.
Num discurso proferido na Assembleia-Geral, o representante norte-americano Robert Wood acusou a Rússia de “propor emendas e ideias desfasadas da situação no terreno”.
“É profundamente preocupante que tantos Estados-membros pareçam ter deixado de falar do drama dos mais de 100 reféns sequestrados pelo Hamas e outros grupos”, disse Wood.
O norte-americano alinhou-se assim com a posição do governo de Israel, que defende que um cessar-fogo na Faixa de Gaza serviria apenas para dar ao Hamas tempo para se rearmar e lançar outro ataque como o que perpetrou a 7 de outubro em território israelita, que fez 1.139 mortos e cerca de 250 reféns, 127 dos quais permanecem em cativeiro.
O embaixador israelita na ONU, Gilad Erdan, reiterou as suas críticas à organização, que acusou de estar “moralmente falida”, por se concentrar em pedir ajuda para os civis em Gaza sem antes fazer tudo para libertar os reféns.
“A ONU é uma arma de guerra nas mãos dos terroristas”, chegou a dizer o representante de Israel, que voltou a pedir a demissão do secretário-geral, António Guterres.
A posição está longe de ser a da maioria dos membros da organização, que hoje reiteraram o seu apelo para um cessar-fogo no enclave palestiniano.
No entanto, não foram os embaixadores dos Estados-membros da ONU os únicos a pronunciar-se hoje a favor de um cessar-fogo: um grupo de “rabinos por um cessar-fogo” levou cartazes para a sede do Conselho de Segurança para apelar ao Governo dos Estados Unidos para que deixe de vetar este tipo de resoluções.
“Biden: o mundo diz cessar-fogo”, podia ler-se num dos cartazes que o grupo levou para a sala, que estava vazia, uma vez que hoje não está prevista qualquer reunião daquele órgão.
No mesmo sentido se expressou no seu discurso na Assembleia-Geral o representante palestiniano na ONU, Riyad Mansour, que perguntou como é possível pensar que a ONU, as organizações humanitárias e milhões de pessoas em todo o mundo “estão erradas” ao pedir um cessar-fogo no enclave.
“Não é motivo de orgulho estar-se errado sozinho”, observou Mansour.
Na sequência da invasão russa da Ucrânia, a Assembleia-Geral da ONU adotou uma nova regra que a obriga a discutir qualquer veto emitido no Conselho de Segurança pelos seus cinco membros permanentes: Estados Unidos, China, Rússia, França e Reino Unido.
No entanto, e apesar de múltiplos apelos de um grande número de países representados na Assembleia-Geral, tem sido até agora impossível proceder a uma reforma do Conselho de Segurança para eliminar, restringir ou mesmo alargar a outros Estados o direito de veto dos seus membros permanentes.
A Assembleia Geral, onde cada Estado-membro das Nações Unidas tem um voto, não pode aprovar resoluções vinculativas, servindo apenas para expressar as posições da maioria dos seus membros acerca dos temas sobre os quais o Conselho de Segurança se debruça.
Em dezembro, uma esmagadora maioria de 153 países votou a favor de uma resolução apelando para “um cessar-fogo humanitário imediato” na Faixa de Gaza, depois de os Estados Unidos terem vetado uma iniciativa semelhante no Conselho de Segurança.
Só dez países votaram contra: Estados Unidos, Israel, Áustria, República Checa, Micronésia, Papua-Nova Guiné, Nauru, Libéria, Guatemala e Paraguai.