Estado da Nação: do “rolo compressor” da maioria ao optimismo económico do Governo

A oposição está a recarregar baterias para chegar ao debate sobre o estado do país, na quinta-feira, com as armas apontadas a António Costa. Entretanto, o Governo prepara a narrativa em torno da melhoria dos indicadores económicos e da ausência de alternativa.

É de costas totalmente voltadas que oposição e Governo chegam quinta-feira ao debate do Estado da Nação. É certo que o debate que encerra a sessão legislativa é sempre marcado por uma clara cisão entre uns e outros, mas este ano os partidos da oposição contaram com um dado novo: o Presidente da República chamou-os a Belém para ouvir as suas queixas e transmitir algumas das suas preocupações e marcou um Conselho de Estado logo para o dia seguir. A oposição sentiu um fôlego acrescido para o debate.

Nas reuniões com Marcelo Rebelo de Sousa, que começaram na sexta-feira e terminaram esta segunda-feira, quase todos os partidos se queixaram do “autoritarismo” da maioria absoluta que sustenta o Executivo de António Costa, da “falta de diálogo” e do “rolo compressor” imposto pelos socialistas para, avisa a oposição a uma só voz, travar o escrutínio feito pelo Parlamento da acção de alguns ministros e impedir um relatório “sério e imparcial” da comissão de inquérito à TAP.

As críticas à falta de diálogo do PS vieram de quase todos os partidos com assento parlamentar, com a porta-voz do PAN, Inês de Sousa Real, por exemplo, a pedir ao primeiro-ministro, por um lado, para “arrumar a casa” e ter “mais diálogo” e, por outro, ao Presidente da República para manter-se “vigilante”.

Luís Montenegro, líder do PSD, também não deixou escapar este tema e disse a Marcelo que, no último ano, deram-se “atropelos graves” ao funcionamento das instituições, dando como exemplo, precisamente, o “rolo compressor” imposto pela maioria PS durante todos os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito à Tutela Política da Gestão da TAP. Mas não foram os únicos.

Também Bloco de Esquerda, Chega e Iniciativa Liberal levaram ao chefe de Estado a mesma preocupação de o PS estar a impedir um verdadeiro escrutínio da parte da oposição e do Parlamento e de estar “fechado sobre si próprio”. Um assunto que Marcelo certamente levará para debate com os seus conselheiros.

Já no fim da ronda de audições – o PS foi o último partido ouvido –, o secretário-geral adjunto, João Torres, foi a Belém negar que o partido use a maioria absoluta para fugir ao escrutínio e ao diálogo com a oposição, disparando contra os restantes partidos: “A oposição é incapaz de intervir construtivamente no debate público”.

João Torres vincou ao chefe de Estado que os bons indicadores económicos são a prova de que se está a entrar num novo ciclo de recuperação e insistiu que “não existe uma alternativa” e que a “oposição não tem estado à altura das suas responsabilidades”. Um recado directo para o PSD.

Recorde-se que ainda há pouco mais de dois meses, quando andava a acenar com a possibilidade de dissolução do Parlamento, o próprio Presidente da República tinha dito que ainda não existia uma alternativa política no país. Uma declaração que irritou o líder social-democrata.

Na altura, Luís Montenegro não só veio dizer que estava pronto para governar – ideia que repetiu na reunião desta segunda-feira com Marcelo Rebelo de Sousa –, como surgiu sentado ao lado de Rui Rocha, líder da Iniciativa Liberal, para mostrar que ambos tinham disponibilidade para acordos pós-eleitorais e podiam oferecer uma alternativa ao país.

“O país não tem esperança, mas tem alternativa”, frisou o líder do PSD à saída da audiência com o Presidente da República. Já acreditará o chefe de Estado que existe uma alternativa política, e não apenas aritmética, no país? Essa será certamente uma questão que Marcelo Rebelo de Sousa levará para o Conselho de Estado de sexta-feira.

O tema das audiências era a “situação económica, social e política” e todos os partidos da oposição fizeram a Marcelo um diagnóstico negativo. À esquerda, os partidos avisaram que o Governo não estava a conseguir resolver os “problemas estruturais” do país. À direita, Marcelo ouviu queixas da “degradação” a que Portugal chegou a vários níveis – saúde, poder de compra, prestígio das instituições, onde se inclui o tal “rolo compressor” –, do “empobrecimento” do país, com muitas famílias sem conseguir pagar rendas, comprar casas, vivendo sem poder de compra e com salários baixos.

O PS leva o discurso preparado, com a ajuda das previsões de Bruxelas: o crescimento económico vai ser superior às previsões que o próprio Governo tinha feito. Mais leve, porque o relatório da TAP o iliba de qualquer responsabilidade, e optimista: é assim que António Costa vai enfrentar o debate de quinta-feira