Para a Associação Portuguesa de Projetistas e Consultores (APPC), quase a comemorar 50 anos, há concursos públicos “marados” e “estranhos” a serem realizados. E dá como exemplo um promovido pelo Ministério da Defesa Nacional (MDN), para aquisição de serviços relacionados com projetos de arquitetura e engenharias, em que a proposta vencedora é 70% mais baixa do que o preço-base do concurso e 60% mais barata do que as das restantes cinco empresas concorrentes.
O contrato em causa está identificado como “aquisição de serviços para elaboração de projetos de arquitetura e engenharias” no âmbito do Projeto NATO – Provide Training and dministration Facility.
Para a APPC, “a política do preço mais baixo” está a afetar a qualidade dos serviços prestados ao Estado, nomeadamente a construção de infraestruturas, além de depauperar as empresas. E desafia, por isso, a Assembleia da República a rever as regras do Código dos Contratos Públicos (CCP).
“Devia haver mais ponderação na relação preço-qualidade, como acontece quando trabalhamos para países estrangeiros”, afirma Jorge Nandin de Carvalho, presidente da APPC, ao NOVO. Segundo aquele responsável, a prática comum seguida pelo Estado em concursos públicos é a opção pelo preço mais baixo. “As propostas técnicas deveriam ser avaliadas independentemente de se saber o preço. Quando se sabe o preço, a avaliação fica logo influenciada. O preço é um dado objetivo. A qualidade, nem tanto. O avaliador não deveria estar condicionado pela questão do custo.” No concurso classificado de “marado” e “estranho”, o MDN apresentou um preço-base de 65 mil euros. Cinco propostas apresentaram preços entre os 59 mil e os 65 mil. A vencedora apresentou um valor a rondar os 19 mil euros. Segundo a APPC, além de um preço “que tudo leva a concluir que seja pouco credível”, o cliente, neste caso o MDN, nem sequer solicitou ao fornecedor “esclarecimentos complementares sobre o modo como pensa realizar o trabalho ou quais as equipas técnicas envolvidas, percebendo, assim, a razão de tamanha disparidade de preços relativamente aos outros, permitindo inclusive concluir se tão baixo preço se deveria a um erro grosseiro do vencedor, ou a custos unitários exagerados, ou até ao desinteresse dos outros concorrentes – o que não é provável”
Segundo Jorge Nandin de Carvalho, “neste caso, o Estado optou pela proposta escandalosamente mais baixa”, além de que a empresa vencedora “não tem o CAE típico das empresas de consultoria de engenharia”. Conforme explicou, é difícil um agente público não adjudicar pelo menor custo. “Há um certo receio de ser posto em causa.”
Por outro lado, diz, o Tribunal de Contas “deveria ser menos burocrático, menos penalizador, mais rápido a decidir”. Além de que, observou, o CCP tem tantos artigos e é tão complexo que facilita muito a litigância e a falta de transparência. “É o CCP da Europa com mais artigos”, revelou.