Hastings Ismay, primeiro secretário-geral da NATO, disse um dia que a organização visava “manter os russos fora, os americanos dentro e os alemães sob controlo”. 75 anos depois da sua fundação, esta frase faz mais sentido do que nunca, mas, neste momento, apenas a última premissa permanece assegurada, pois a vitalidade da NATO vive sob duas ameaças muito reais: a possibilidade de Donald Trump ser novamente eleito presidente dos Estados Unidos já em novembro e a invasão russa na Ucrânia e ameaça ao leste europeu.
A criação da NATO, a 4 de abril de 1949, foi uma resposta coletiva do hemisfério ocidental à crescente ameaça soviética, que ia “conquistando” países no leste europeu e intimidava outros, como a Itália ou a Grécia. Josef Estaline evocava o terror do Exército Vermelho, aumentando o receio de uma nova guerra na Europa. As democracias europeias, os aliados norte-americanos delinearam estratégias e o presidente Harry Truman decidiu que era tempo de responder e “fazer o necessário” para impedir que Estaline seguisse os passos de Hitler.
Ao contrário do período anterior à Segunda Guerra Mundial, o Partido Republicano abandonara o isolacionismo e apoiara activamente a criação da NATO, o Plano Marshall e toda a infraestrutura diplomática delineada através da Doutrina Truman para enfrentar a União Soviética. Durante os últimos 75 anos, republicanos e democratas mostraram-se atlantistas, considerando os parceiros europeus fundamentais na esfera diplomática e militar do país. Poucas causas angariaram tanto apoio bipartidário em Washington como a NATO. Mesmo durante a crise da Aliança pós-Guerra Fria, esse consenso nunca esteve em risco.
Contudo, esse entendimento alargado foi pela primeira vez colocado em causa durante os quatro anos da administração Trump. John Bolton, conselheiro de Segurança Nacional de Trump, confessou que o ex-presidente norte-americano considerou a retirada dos Estados Unidos da NATO durante a cimeira de 2018. No entanto, mesmo nesses anos e perante as posições desafiadoras de Trump, os Secretários de Defesa James Mattis e Mark Esper e os SSecretários de Estado Rex Tillerson e Mike Pompeo souberam sempre guiar os destinos da NATO dentro dessa lógica bipartidária.
Um segundo mandato de Trump será, no entanto, bastante diferente. Isso é certo. Não podemos esperar que, por exemplo, esses cargos sejam ocupados por políticos que apoiam sem reservas a NATO ou que respeitem as convenções bipartidárias. Além disso, as simpatias de Trump e de seus aliados mais próximos são conhecidas: admiram Putin e criticam Zelensky.
Foi devido a um pedido exclusivo de Trump que o pacote de ajuda à Ucrânia foi bloqueado na Câmara dos Representantes. O Speaker Mike Johnson foi mesmo ameaçado de destituição pela congressista Marjorie Taylor Greene, próxima de Trump, caso leve o pacote a votação, que deverá ser brevemente votado, mas está há mais de quatro meses parados devido à interferência trumpista.
Com a possibilidade de Trump ser novamente presidente no início do próximo ano, há o receio fundado de que este regresso possa colocar em causa a sustentabilidade da Aliança, numa altura em que é mais necessária do que nunca. Esta assombração terá sido certamente um dos temas das conversas da reunião da NATO que teve lugar esta semana em Bruxelas entre os responsáveis dos 32 países que neste momento compõem a NATO, depois da entrada recente da Suécia e da Finlândia.
Numa altura em que a Rússia ameaça invadir países da NATO e com tropas a combater em solo ucraniano, a união dos países membros é fundamental para combater esta ameaça externa. Mas, além da possível eleição de Trump, com países como Hungria ou a Eslováquia, com governos próximos de Putin, ou o gigante turco, que cada vez mais parece um ator independente da NATO, há também o perigo interno, que é cada vez mais preocupante.
Foram 75 anos de uma sólida aliança, mas será que sobreviverá a 2025?
Especialista em política norte-americana